(De vez em quando o Diário do Pará faz jornalismo, a matéria a seguir é um exemplo disso e só podia ser do Frank Siqueira. A reportagem a seguir foi publicada no jornal O Diário do Pará com a grave denúncia ambiental. O PV espera apuração)
“Domingo, 04/09/2011, 07h21
Afetado pelas distorções e fraudes que desequilibram o mercado de combustíveis no Brasil, o Pará sofre não apenas perdas financeiras - o que já é muito grave para um Estado que necessita dramaticamente de investimentos em serviços públicos e projetos sociais. Aqui, as populações de Belém e das cidades que integram a região metropolitana – Ananindeua, Marituba e Santa Bárbara – estão respirando, ao que tudo indica, um ar poluído pela queima de óleo diesel com teor de enxofre além do permitido.
A denúncia foi feita nesta sexta-feira, durante encontro realizado na Estação das Docas, pelo advogado Francinaldo Oliveira, assessor jurídico do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Estado do Pará. Na região metropolitana, segundo ele, só pode ser utilizado o diesel S50, um combustível especial que libera menos enxofre, deixando o ar mais limpo. Esse diesel, de coloração verde e preço mais alto, foi adotado no Brasil como forma de diminuir a poluição nos grandes centros urbanos. Além dele, temos o diesel comum, o S500, de coloração vermelha, mais barato e de uso recomendado apenas fora das regiões metropolitanas.
Porém, segundo afirma Francinaldo Oliveira, análises feitas pela ANP (Agência Nacional de Petróleo) em amostras de combustível colhidas em Belém têm feito referência ao diesel de coloração vermelha, o que indica estar ocorrendo aqui o comércio – ilegal – de diesel S500.
O assessor jurídico do Sindicombustível acrescentou que está havendo também a suspeita de desvio fraudulento de óleo diesel destinado ao abastecimento da frota pesqueira do Pará. O óleo que abastece a indústria de pesca, segundo ele, não contém biodiesel e é subsidiado pelo governo com a isenção de impostos – PIS, Cofins e ICMS, o que torna seu preço final sensivelmente mais barato do que o valor pago pelo consumidor comum. Sem entrar em detalhes, o advogado acrescentou haver hoje elementos que reforçam a desconfiança de que o óleo diesel subsidiado vem sendo submetido a descaminho para abastecer frotas particulares, inclusive de ônibus.
Na condição de participante de um encontro que abordou como destaque em sua programação as fraudes tributárias e as distorções que desequilibram o mercado de combustíveis no Brasil, Francinaldo Oliveira observou que a gasolina consumida em Belém é, no geral, de boa qualidade. Em relação ao álcool hidratado, ele disse que o produto aqui é muito caro em relação à gasolina, tornando-se, assim, muito pouco atrativo para os consumidores. O baixo consumo, que o faz ficar armazenado nos tanques por muito tempo, de um lado, e de outro a elevada temperatura e a alta umidade do ar se combinam para uma condensação intensa acompanhada de gotejamento. “Aí acontece de o álcool sair da especificação”, acrescentou.
Ganhos com fraudes superam lucros de distribuidoras
Cálculos conservadores, realizados pelo sindicato do setor, estimam em mais de R$ 1,2 bilhão por ano o valor das perdas sofridas pelo Brasil em decorrência das distorções e fraudes tributárias no setor de combustíveis. “Os ganhos das fraudes tributárias superam em muitas vezes as margens brutas de distribuidoras”, afirmou na sexta-feira em Belém o presidente do Sindicom (Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes), Alísio Vaz.
As operações fraudulentas estão relacionadas principalmente, segundo ele, ao comércio clandestino de álcool hidratado, que sozinho deve responder por perdas anuais estimadas em torno de R$ 1 bilhão. Alísio Vaz, que veio a Belém especialmente para participar do VIII Encontro dos Revendedores de Combustíveis e Lojas de Conveniência da Região Norte, denunciou a existência de “empresários picaretas” que se especializaram em buscar formas de fraudar os tributos, através da sonegação, da inadimplência e de outros artifícios.
As fraudes praticadas na comercialização do etanol hidratado, conforme frisou Alísio Vaz, são propiciadas por distribuidoras “não idôneas”, conhecidas como “barrigas de aluguel” e geralmente constituídas em nomes de laranjas. Essas empresas são usadas como intermediárias nas operações de compra junto às usinas. A estas se somam, às vezes como uma só pessoa ou uma só empresa, a figura do “inadimplente profissional”, como é conhecido no meio o mau empresário que se estrutura para não pagar em dia os impostos ou simplesmente não pagá-los nunca.
O presidente do Sindicom enumerou, entre as fraudes mais comuns no comércio do álcool hidratado, a venda sem nota fiscal ou utilização da mesma nota para realização de várias operações de venda, a venda de “etanol para outros fins”, para distribuidoras de combustível ou atravessadores, ou ainda a falsa operação interestadual, com alíquota reduzida de ICMS.
O presidente do Sindicom disse que, além da sonegação de tributos, há ainda a adulteração e a mistura do combustível com produtos menos tributados, ações fraudulentas que afetam também a arrecadação tributária e causam prejuízos aos consumidores. “E algumas distribuidoras que fraudam são oficiais”, denunciou o dirigente do sindicato nacional, que comanda em todo o país uma fantástica rede de distribuição composta de 18.500 postos de serviços pertencentes às suas 12 marcas associadas.
De acordo com Alísio Vaz, o mercado nacional de combustíveis, que comercializou no ano passado 107,4 bilhões de litros e registrou um faturamento de R$ 210 bilhões, acaba sendo permeável às fraudes não somente por causa dos altos valores envolvidos, mas por diversos outros fatores. Entre estes, ele aponta as deficiências na fiscalização tributária, a complexidade da legislação brasileira e as anistias concedidas pelo governo, que indiretamente representam um prêmio aos maus pagadores e aprofundam as distorções do setor. “Sem contar que temos no Brasil uma espécie de cultura da sonegação”, acrescentou.
Assinalou o dirigente sindical, citando dados de um levantamento realizado pela ANP, a Agência Nacional do Petróleo, que a carga tributária incidente sobre os combustíveis no Brasil são excessivamente elevadas. O setor arrecadou, no ano passado, R$ 64 bilhões, sendo R$ 25 bilhões de tributos federais e R$ 39 bilhões de impostos estaduais. No caso do etanol, por exemplo, para um preço médio ao consumidor de R$ 1,99 no período em que se realizou o estudo, apurou-se que 23% eram impostos.
Praticamente o mesmo percentual (24%) incide sobre o valor do óleo diesel, cujo preço médio considerado foi de R$ 2,01. Já no caso da gasolina, a voracidade da máquina arrecadadora do governo é ainda mais acentuada, chegando a 40% o percentual correspondente aos impostos (Cide, ICMS e PIS/Cofins). O custo do produto representa, na verdade, apenas 42% do valor pago pelo consumidor ao abastecer o carro.
Sindicom: sem fiscalização todos perdem
O presidente do Sindicom advertiu que as distorções e fraudes nos combustíveis, de qualquer tipo, causam problemas sérios e pesados prejuízos para todos, governo e sociedade. Os consumidores, segundo ele, são prejudicados pelos defeitos causados no veículo pelo combustível adulterado e de má qualidade, pela perda de desempenho e autonomia do carro e, pesando no bolso, pelo pagamento de um volume menor de combustível a que teria direito se não houvesse a fraude.
Do ponto de vista social e institucional, conforme enfatizou, os prejuízos são devastadores. Perdem os governos e a sociedade pela redução da capacidade de investimento do Estado, pelo crescimento da corrupção e do crime organizado, e perdem ainda as autoridades e as instituições públicas pelo descrédito resultante de sua aparente ineficácia.
Já as distribuidoras e os revendedores, segundo Alísio Vaz, são fortemente prejudicados porque competem com preços predatórios, perdem competitividade em função da concorrência desleal e ainda têm sua imagem desgastada, perante o público consumidor, em função das oscilações de preços.
No entender do dirigente sindical, o governo deve priorizar o combate às fraudes nos combustíveis, com ênfase no etanol, através de quatro linhas básicas de ação: foco nas distribuidoras com preços abaixo de custo, agilidade e rigor no tratamento de inadimplentes, fiscalização de trânsito para coibir as vendas clandestinas e implementação de força-tarefa envolvendo a Secretaria da Fazenda, ANP, prefeituras, polícias e Procon.
Para fechar ainda mais o cerco aos fraudadores e sonegadores de impostos, ele defende a publicação mensal, pela ANP, de um ranking estadual de distribuidoras, por produto; apoio ao Comitê Nacional de Combate à Sonegação no Etanol; esclarecimento sistemático ao Judiciário, para evitar decisões que inibam punições aos fraudadores; e o uso de informações da nota fiscal para identificar e coibir fraudes, mediante cruzamento de dados do produtor com os da distribuidora.
(Diário do Pará)”