Na edição de O Liberal, uma interessante matéria, aborda a febre dos papagaios chineses que invadiram Belém, questionam com o maior fabricante dos nossos, o Cobra, se a tradição está ameaçada. Cobra afirma que não.
A nossa tradição de construir e empinar papagaios está ameaçada sim, mas não pelos chineses. É que as crianças de hoje perderam os espaços urbanos para praticar a brincadeira, além disso, não sabem construir os verdadeiros papagaios.
Nos bairros, onde a rua ainda é o local para empina-los, as crianças usam uma "cangula" , feita de saco de supermercado, coisa feia e sem a menor criatividade.
No meu tempo de Guamá, todos os moleques sabiam fazer o seu próprio papagaio, “encerar” a linha e dar “laço”. Era só virar o "geral" que nós íamos para as ruas, sem os fios da Celpa, colocar nossos papagaios no ar. Tinha de todos os tipos: o “vezinho”, o “bandola”, o “japão”. Um que subia no “leso”, aquele que pegava no “treme”, um papagaio “penso”, precisava de barriga ou de um pano para não “enterrar”.
Quem não sabia “empinar” papagaio, fazia subir uma “cangula” de papel, uma “rabiola” ou uma "curica".
Todos eram obrigados a dar “laço”. Só os “penosos” não participavam da brincadeira. Para dar “laço” era preciso obedecer a regra: não valia pegar no “gasgo” ou “dar na mão”. Cortar e aparar era muito perigoso, pois a linha bamba do papagaio que ia chinando podia cortar o que estava no ar.
E os tipos de “cerol”? O mais famoso era o “cerol do aço do pico” - na verdade acido pícrico, tinha o cerol de cola e também de goma. A linha não podia ficar com "bololo". Tinha cerol para o "discai" ou para o "pendura".
A brincadeira começava com a fabricação do papagaio, a escolha da linha, o vidro para o cerol, encerar a linha, fazer o rabo do papagaio, esperar o bom vento e colocá-lo no ar. Depois era só dar cabeça e o laço. Se você fosse o último a baixar o seu papagaio, podia ganhar o título e a fama de “fanchão”.
Depois eu faço um dicionário com as gírias dos empinadores de papagaio. Por enquanto a conversa é só para quem empinou um bom “enguinador”.