Os fiscais do IBAMA que realizavam um
operação de combate ao desmatamento na Rodovia BR-163, ao encontrarem carretas
nas imediações de uma reserva indígena, suspeitas de estarem sendo utilizadas
para o cometimento de crime ambiental, decidiram queimá-las, provocando revolta
de moradores e produtores das localidades de Cachoeira da Serra e Castelo dos
Sonhos, distritos de Altamira. De um lado, os ficais do IBAMA defendem o ato
com base no poder de polícia ambiental. De outro, os produtores acusam os
fiscais de abuso de poder.
De que lado estará o direito ambiental?
O direito ambiental brasileiro tem no
licenciamento e na fiscalização dois poderosos instrumentos de proteção ao meio
ambiente. Através deles, a administração pública limita e disciplina as
atividades ou empreendimentos privados respeitando sempre o princípio da livre
iniciativa e da legalidade.
Para disciplinar e limitar as atividades
privadas e a sua própria atividade, a administração pública se vale do Poder de
Polícia previsto no art. 78 do Código Tributário Nacional. O Cidadão deseja exercer seus direitos e a AP
detém a incumbência de condicionar o exercício daqueles direitos ao bem estar
coletivo. Para Zanobini: “Tudo
aquilo que é juridicamente garantido é também juridicamente limitado”. (Carlos
Eduardo Ferreira Pinto – FGV)
• “Art. 78. Considera-se poder de polícia a
atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse
ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de
interesse público concernente à segurança à higiene, à ordem, aos costumes, à
disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas
dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade
pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”.
O poder de policia aplicado ao meio
ambiente, completa-se com outras normas, dentre as quais a Lei n.º 9.605/2008,
regulamentada pelo Decreto 6.514/2008.
Para o caso concreto aqui analisado, a
fiscalização do IBAMA aparentemente valeu-se dos incisos IV e V do art. 72 da
Lei dos Crimes Ambientais, combinada com o inciso V do art. 101 do Decreto
acima referido, para destruir os instrumentos da infração. Resta saber, porém,
se os agentes públicos tomaram cuidado de observar as ressalvas desse mesmo decreto.
As medidas administrativas ambientais
estão listadas de forma crescente, da mais branda para a mais drástica, sendo a
destruição e demolição as duas últimas opções. O agente, justamente para
incorrer em abuso de poder, só deve adotá-las se com “objetivo de prevenir
novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado
prático do processo administrativo”, conforme § 1.º do artigo acima citado.
Se as carretas não estavam dentro da
reserva, nem transportavam madeira ilegal e poderiam ser deslocadas das área de
ameaça ao meio ambiente – no caso, as reservas extrativistas – os agentes
poderiam perfeitamente ter optado pela apreensão dos bens, levando-os do local
da ameaça do dano, entregando-as para a guarda das autoridades policias, cumprindo
o objetivo da lei, sem necessidade de destruição do bem.
Nesse caso, a solução jurídica viria do
inciso I do art. 111, conforme a seguir:
“Art. 111. Os
produtos, inclusive madeiras, subprodutos e instrumentos utilizados na prática
da infração poderão ser destruídos ou inutilizados quando:
I - a
medida for necessária para evitar o seu uso e aproveitamento indevidos nas situações
em que o transporte e a guarda forem inviáveis em face das circunstâncias; ou
II - possam
expor o meio ambiente a riscos significativos ou comprometer a segurança da
população e dos agentes públicos envolvidos na fiscalização.
Parágrafo único. O
termo de destruição ou inutilização deverá ser instruído com elementos que
identifiquem as condições anteriores e posteriores à ação, bem como a avaliação
dos bens destruídos.”
A utilização do poder de polícia, portanto,
sofre limitações: aplicação do princípio da proporcionalidade dos meios aos
fins. O poder de policia não deve ir além do necessário para a satisfação do
interesse público que visa proteger o bem público.