Os meses de janeiro a abril são típicos pelo aumento de chuvas na
Amazônia. Por aqui cai tanta água que não é exagero dizer que na Amazônia tem
um rio aéreo. O fenômeno acontece em decorrência de fatores ambientais que só
ocorrem localmente.
A Amazônia é um lugar absolutamente particular em todo o planeta Terra,
aprendi isso com o geólogo e professor Gabriel Guerreiro. É a única bacia
continental na linha do Equador que é fechada por todos os lados. Os ventos
alísios sopram do mar do Atlântico Sul em direção da Amazônia, carregando
enorme quantidades de vapor d’água. Esse vapor bate nos Andes, no Parima ou no
escudo brasileiro, sobem, resfriam e caem em grandes quantidades.
No solo, a chuva cuidou de construir inúmeros canais de irrigação, por
onde passam toda a água que se precipita por sobre a Amazônia. Esses canais
alimentam os igarapés e rios e vão desaguar no oceano, evaporando para
reiniciar o ciclo das chuvas. Mantido assim, tudo funcionaria sem grandes
problemas para as pessoas e para o meio ambiente.
Janeiro de 2014 chegou e no primeiro sábado do ano, em Abaetetuba, 30
casas construídas por sobre o rio Maratauíra, foram tragadas por uma grave
erosão. Os desastres provocados pelas ocupações irregulares cada vez fazem mais
vítimas.
O rio Tapajós começou a subir. O Xingu também subirá. Logo, logo, o
Araguia e o Tocantins vão ocupar suas margens, como fazem todos os anos. E cada
vez que isso acontece, os águas encontram barreiras que impedem a passagem
natural em direção ao mar.
As cidades amazônidas foram construídas sem planejamentos e sem
respeito à natureza. Os canais por onde passavam as águas precipitadas pelas
chuvas foram aterrados. Os igarapés tornaram-se valas para receber esgotos e
lixo de todo o tipo. As margens dos rios foram desmatadas e depois ocupadas por
moradias para abrigar as pessoas pobres que não conseguem se fixar nas áreas
altas e secas das cidades.
As autoridades não planejam o crescimento e nem a ocupação do solo
amazônico. Não temos por aqui nenhum exemplo de cidade com características
regionais. As nossas cidades tem baixo índices de saneamento com tratamento de
esgoto. Os lixos produzidos em grande quantidades são acumulados em vazadouros
a céu aberto, com o chorume escorrendo e contaminando o lençol freatico. Água
tratada e de boa qualidade quase nunca chega nas torneiras das casas das nossas
cidades. As campanhas eleitorais são momentos de distribuir asfalto e aterros
para as baixadas. E as baixadas, são justamente a morada das águas.
Quando os rios encherem, cobrirem as margens e as casas forem
inundadas, as famílias serão retiradas para ginásios, receberão algumas cestas
básicas e depois voltarão para as mesmas condições de antes. As chuvas
continuarão a cair e sem ter para onde correr, tentarão se infiltrar pelas
frestas do asfalto, do cimento ou do aterro. Em pouco tempo se abrirão novas
crateras, engolindo casas e provocando vítimas.
Os governadores e os prefeitos podem mudar esse quadro. Como? No lugar
de ficar esperando as tragédias acontecerem e decretar estado de emergência que
tal ir planejando a drenagem, o saneamento e as moradias, respeitando o caminho
que as águas traçaram ao longo de muitos anos? Cada cidade tem uma ou mais
bacias hidrográficas. Se forem respeitadas no planejamento urbano, com certeza
viveremos com qualidade de vida e sem vítimas.